ariana

a bélica volúpia das coxas
pedala, rígida, em rotina
ebule o sangue ensimesmado
na reserva enclausurada do temor

veio ao mundo para completar
a ariana já outrora poetizada
meteu-lhe um M no início
para fincar no mundo
a sentença:
é mulher

as guerras propaladas
os copos quebrados
corpos, aos montes,
empilhados

morrer nas fendas áridas
dos silêncios e hiatos
da sua fala

sucumbir à madura fruta
de onde pendem as lembranças
num eco intenso
de ardor

observar o futuro após a serra
enquanto rangem os dentes
ciosos por saltar

navegar calmamente
à mercê do tempo:
aguardar

suportar num pico qualquer
o sádico soprar das lâminas
travestidas de brisa

investigar a crueza das suas pétalas
suburbanas com a delícia da
última
ceia
do derradeiro
seio

saber que nenhum corpo outro
habitará o espanto das minhas palmas:
certeza

poemas vertem estridentes
caudalosos feito o mar
que banha as costas
da sua cama: perfume

orbito em espirais pelas urbes
cíclico, ciclista, berlinês,
paulista
augusta
aflita
que fuma
embriagada
palpita

o esmaecer das mechas
ofusca o fim do túnel
e aponta o espinhoso caminho
de som

as vestes binárias,
brancas/pretas
dançam formas abstratas
no ampliar estonteante
da sua andança

rejuvenesce em fagulhas douradas
um destino que cruza em tempestade
o musgo pântano do porvir

inolvidáveis as formas
esculpidas em fragrâncias
crispadas de morte

um sorrir arrancado
da ironia pantomima de
atriz

um querer-se brilhar enorme
simultâneo a um profundo
dormir

quantos homens nasceram de mim
e hei de parir?

quantas vezes possuirei, com os punhos,
o fulgor de cada gota doce
que pulsar?

quantos filhos brotarão do seu ventre
de flama
e repousarão silentes
neste drama?

quantas vezes gritarei seu nome sobre
o planalto espesso?

quantos territórios e vazios seus
terei de ocupar?

quantas incertezas preencherão
o tempo entre uma boca
e outra?

quantas cicatrizes tecerão
a fio
os calafrios
deste amor?

quantas lógicas e fórmulas
perderão-se nos livros
quando lhe tocar?

de quantas arianas é preciso
para multiplicar o mundo
quando ele todo
de você floresce?

Sobre Rodolfo Araújo

Jornalista, amante do teatro, um (des)crente (in)constante.
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